O LIVRO MAÇÔNICO PARA OS MAÇONS

por Luiz Gonzaga Rocha

Os livros maçônicos são caros, isto todos sabemos. São caros por serem preciosos, disto poucos sabem ou se apercebem. Os maçons não leem, também o sabemos, e o sabemos desde Kurt Prober. Não leem? Mito ou realidade? Acreditamos que toda evolução (ação) bem como toda involução (inércia) é fruto de um desvio. E que desvio? O desvio da falta de oportunidade. O que me acode a escrever sobre a questão dos livros maçônicos para os maçons é por entender haver nesta assertiva de que os maçons não leem, muito misticismo (disposição para crer no sobrenatural), mito (representação fantasiosa) e muito pouco de realidade (verdade).

Tenho em mente três relatos para apresentar: um diz respeito à publicação do livro “O último gozo do mundo”, de Bernardo Carvalho, editado pela Companhia das Letras (2021, 144 páginas, R$ 49,90). Outro, o livro “O riso dos ratos”, de Joca Teiners Terron, publicação da editora, Todavia (2021, 208 páginas, R$ 62,90). Dois romances de vozes da literatura brasileira contemporânea que mergulham em um Brasil distorcido pela doença (Sars-Covid19) e pela violência. O terceiro, o livro “Pequena História dos Ritos Maçônicos – praticados no Brasil”, de minha autoria, editado pela editora maçônica A Trolha (2021, 250 páginas, R$ 70,00). Proporcionalmente, temos por demonstrar o investimento de 35, 30 e 28 centavos por página, respectivamente. Objetivamente, o primeiro livro é mais caro que os dois outros. Visualmente, o terceiro é o mais caro deles. Por óbvio, não vou me indagar sobre qual poderia recair a preferência do maçom.

Agora, mudemos o foco, para que possamos ter outra percepção dos mesmos livros enfocados. O livro “O último gozo do mundo”, em tom de fábula, narra o futuro em que a professora e socióloga precisa lidar depois de encerrar um relacionamento quando a pandemia começou. Com uma criança pequena, a mulher empreende uma jornada Brasil adentro em busca de respostas para um país cada vez mais dominado pela morte e pelo messianismo. Parte em busca de uma resposta, de uma espécie de profeta, um sobrevivente do vírus capaz de prever o futuro. O livro “O riso dos ratos” foi concebido a partir de uma situação individual do autor, que ao enfrentar um problema de saúde, começou a escrever um diário, agora transformado em livro. O seu personagem é um sujeito retraído, introspectivo, razoavelmente sociofóbico, e genitor de uma jovem vítima de abuso sexual, e o pai promete matar o estuprador em ato de vingança. A jovem nunca aparece na narrativa (não se sabe se é viva ou morta) e assim, a prometida vingança não ocorre. O livro “Pequena História dos Ritos Maçônicos” é fruto de pesquisa e estudos maçônicos histórico-comparativo dos ritos praticados no Brasil pela maçonaria regular. Não possuem um personagem específico, não retrata idiossincrasias pessoais e não expõe melodramas específicos. São três relatos textualmente “coesos”.

E mais uma vez, alterando o foco da narrativa, vamos nos situar na quantidade de exemplares impressos em cada uma das publicações, e nos mecanismos de exposição midiático e comercialização dos três livros destacados. No expediente dos livros “A”, “B” e “C” não consta a quantificação das edições. Esta informação as editoras há muito suprimiram aos leitores. Em um exercício de imaginação, vamos supor seja de 2.000 a 5.000 exemplares para os livros “A” e “B”, e isto considerando número mínimo para poder atender a logística de distribuição e exposição às livrarias do país. Ademais, imaginamos contarem com a contratação da mídia para fazer os exemplares chegarem ao seu público-alvo. O livro “C”, sabe-se ser a tiragem inferior a 1.000 exemplares, inexistindo pontos de distribuição, exposição e comercialização nacional, exceto o da própria editora. Já imagina o Irmão que isto tem reflexo no preço final do livro. Dito com outras palavras, o livro visualmente mais caro, deixa menos benefícios econômicos se comparado ao livro mais barato. E isto, por si só, gera três ocorrências.

Compreensivelmente, o livro “C” atende a um público mais reduzido (e isto não é pleonasmo), a oferta é menor, o preço é elevado, primeiro para cobrir as despesas de edição, e depois, para gerar o lucro da editora e uma vantagem financeira para o autor. Ocorrências essas que poderia ser mais bem equacionada com uma tiragem ampliada, ganho em escala e redução dos custos operacionais, beneficiando o leitor na ponta final. O livro, neste caso, chegaria ao alcance de muitos. Neste diapasão, não nos parece crível acusar o maçom, propagando que este não gosta de ler. Penitencio-me e faço mea-culpa, pois já escrevi antes destacando este particular entendimento.

Em outro viés, vamos considerar que o livro seja bom ou muito bom no sentido de atendimento à expectativa do leitor, e em assim sendo, logo começa a circular na forma de pdf entre os leitores. Então, como é comum, a leitura torna-se “apressada” e é pouco compreendida. Não é que eles não saibam ler ou que tenham uma compreensão diferente do texto lido no modo pdf em relação ao texto impresso. O problema é que a leitura no modo pdf, que poderia vir a ser a saída para garantir a sustentabilidade econômica do livro, da editora, e do autor, em primeira e última instância, não se configura assim. Com o pdf poucos ganham.

Quase por fim, tenhamos em mente o seguinte fato; enquanto nos grandes centros urbanos as grandes livrarias estão cerrando suas portas, pequenas livrarias (e sebos) estão reaparecendo em diferentes cidades do país, e isto ocorre em cidades pequenas e distantes dos grandes centros. Pequenas livrarias (e sebos) ganham sobrevida com o comércio eletrônico (e-commerce), graças aos marketplaces que as coloca lado a lado ou em parceria com gigantes do mercado livreiro como Magalu, Saraiva, Submarino, Mercado Livre, Amazon e Shopee, fazendo com que surja uma miríade de pontos de cultura e centros responsáveis pelo aprofundamento da leitura e da circulação de livros novos e usados. Os clientes desses novos pontos de cultura, não se sabe se são ou não maçons, entrementes, estando atuando como antiquário no segmento, posso asseverar que um em dez clientes sejam maçom por conta dos livros que adquirem, enquanto, no cômputo geral, quatro em dez são pessoas do sexo feminino, seis em dez são pessoas do sexo masculino, ou seja, pelo menos dois em seis pode serem maçons. O que nos permite asseverar que os maçons estão, pelo menos, comprando livros maçônicos.

À guisa de conclusão, penso que a afirmativa de que o maçom não lê, bem pode ser verdade, mas, se isto acontece, é uma decorrência natural da ausência do livro maçônico no seu habitat, no seu cotidiano, no seu círculo maçônico íntimo. Não se trata de criticar por criticar ou de apontar o dedo e taxar o maçom de inculto em termos de literatura maçônica, e não se trata, nem mesmo de pretender deduzir que o maçom seja pouco alfabetizado. O problema, como supomos, reside na reduzida editoração dos livros maçônicos, no seu custo final visualmente elevado, e na precariedade da distribuição, exposição e divulgação midiática por parte das editoras e por parte dos próprios autores. O problema é externo ao desejo ou não de leitura de livros maçônicos.

Assustador? Não! Normal. Se o livro não chega ao maçom não se pode exigir deste a leitura. Sem colocar os livros ao seu alcance condena-se os maçons ao cárcere por conta da ausência dos livros e da leitura. O maçom, creio, não é um ser sem interesses culturais. Não é justo nem perfeito execrá-lo aos olhos do público ou condená-lo ao ostracismo cultural. Ser diferente, comparativamente, é ser como o passageiro que se põe a esperar um ônibus onde não passa ônibus. Agora, se o maçom não consegue entender o que lê, isto é outro assunto. Este é o caso de alfaletramento, mas alfaletrar maçons não é a missão corporativa da maçonaria.

Existe ainda este último parágrafo, e peço paciência ao Irmão. Ele entrou no meu campo mental somente ao término do artigo, e vai dizer da relevância do livro na vida do leitor, pois o livro, qualquer livro, é sempre uma obra de arte. Não importa o que revele, não importa o autor ou a quem o livro possa alcançar, é sempre uma obra de arte. A recompensa do autor é o reconhecimento da sua arte; a recompensa do livro é a leitura, é ser lido por muitos. Gostei muito das palavras de Tolstoi, falando das artes no livro “O que é Arte” (p. 71). Tolstoi nos disse que “a arte não é, como dizem os metafísicos, a manifestação da ideia misteriosa, ou beleza, ou Deus; não é, como os estetas-fisiologistas dizem, uma forma de brincar em que o homem libera excedente de energia estocada; não é a manifestação de emoções por meio de sinais exteriores; não é a produção de objetos agradáveis; não é, acima de tudo, prazer; é sim, um meio de intercâmbio humano, necessário para a vida e para o movimento em direção ao bem de cada homem e da humanidade, unindo-os em um mesmo sentimento”. Agora sim! O digo: “Livro, livro, és a ponte que une o profano e o sagrado; é bendito aquele que sair a te escolher”. (Brasília/DF, jun 15, 2021).

Argumentos para buscas: Livros Maçônicos. Literatura e Comportamento. Crítica Literária Maçônica. Estudos Maçônicos. Postagem: Asceta.33 – jun 21, 2021 – LGR

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